Street Liability

Em Toronto, um ciclista agarra-se ao carro (não sei se para se apoiar apenas, se para ganhar velocidade) de um suspostamente advogado famoso (ligado a direitos humanos, justiça, etc.). Sem se perceber porquê, o dito advogado "passou-se" e arrastou o ciclista empurrando-o contra pilaretes na tentativa de o afastar do seu carro. Resultado desta "raiva momentânea": o ciclista morreu e o automobilista vai preso. Podem ler o resto aqui.


Quantas pessoas conhecemos (ou nós próprios) que são calmos, mas no trânsito transformam-se? Não sei se pela frustração de uma mobilidade real distanciada da mobilidade propragandeada ou se pelo alheamento quase total dos sentidos em relação à realidade, whatever.



Mas o melhor é ler os comentários que são feitos. Sei que os comentários na internet são, muitas vezes, a distilação de raiva concentrada, potenciada pela cobardia do anonimato, mas dá para perceber um certo "desconforto" para com o ciclista. Marginalizados por um sistema demasiado "car-based", ficamos entalados entre uma visão demasiado rígida e completamente distorcida do código da estrada e uma incapacidade nata de lidar com a falta de regras. Se circulamos na estrada (que também é nossa por direito) é porque atrapalhamos o trânsito, se alguém decide ir pelo passeio ou por uma via de lazer é porque causam acidentes aos peões (até podem falar da falta de disciplina de alguns ciclistas, mas isso acontece com automobilistas, peões, etc., etc.).

A verdade é que se existe um veículo que consegue circular em quase todos os cenários, estrada, fora dela, passeios, transportes, etc., dá uma dor de cotovelo brutal! Mas o mais impressionante é que este veículo é barato e acessível a todos! Porque não tentar?



Na minha deslocação diária faço uma via em sentido contrário. Hoje fui interpelado por um senhor de idade todo revoltado. Agradeço a sua dica, pois ao contrário do exemplo em cima, pedalar costuma puxar o meu lado melhor! O senhor ia com uma criança na mão, na faixa de circulação dos carros, pois o passeio estava minado de carros estacionados (em frente a uma escola).
Mais à frente viro à direita num cruzamento com o semáforo vermelho. Sem espinhas pois o trânsito que circulava nessa altura nunca colidiria com o meu movimento. À frente outro sentido proibido. Vou deixar a minha filha ao infantário e para isso coloco a bicicleta durante 5 minutos na entrada do prédio. À porta uma confusão generalizada de carros no passeio, no meio da estrada com 4 piscas, senhoras a atravessar a estrada a correr com míudos ao colo...porque não têm sítio para estacionar mesmo em frente. O que pergunta a auxiliar toda indignada? "De quem é isto aqui? Não quero isto interrompido!". Referia-se à bicicleta, claro. Ri-me e disse que era minha. Tirei-a logo pois o engarrafamento que causava era descomunal (NOT). Está incuto no consciente das pessoas!

Se estou contente com o facto de quebrar regras de trânsito? Não, não estou, mas tenho a noção de que é tudo desenhado para uma sociedade de carros. Os sentidos únicos são promovidos para que haja mais estacionamento, para além de que se seguirmos esses sentidos damos uma volta descomunal, mais apropriada a quem tem um motor do que a quem tem de pedalar. Os semáforos (assim como as lombas) são (más) invenções para tentar regrar um trânsito causado por automóveis.

Circulação de bicicletas em vias de sentido único assim como virar à direita quando o semáforo está vermelho são alternativas já dadas em países do norte da Europa. A isto chama-se "Street Liability" e é o que não acontece por cá, onde o mais fraco (peão, depois ciclista) não é protegido e apenas tido em conta após o mais forte (o carro).


Não se pode contruir nem legislar em função desta pirâmide invertida, nem pelo facto destes serem mais. Em portugal os passeios são invadidos pelos "mais fortes", por vezes não existem ou são pouco apropriados aos "mais fracos". O meu avô que tem dificuldades motoras resigna-se a ficar por casa pois não consegue andar em certos passeios, subir as escadas e contornar todos os carros em estacionamento indevido. Isto é de país desenvolvido?

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2 comentários:

um homem na aldeia disse...

Disse ontem um director da minha empresa: "De bicicleta? Então se a empresa me dá um carro?!"

Gonças disse...

E os deputados que lhes dão o passe?? hehe

Bem-vindo de volta...