Saio de casa e estava menos frio, mas estava húmido.
A bicla rolava e parecia que a humidade fazia barulho ao tocar no quadro, nas rodas, no meu casaco.
Na curva do sol como lhe chamo, pois vira-me para nascente, o astro-rei lutava contra uma muralha de nuvens grossa. Precipito-me na descida que me leva ao cheiro inebriante do café matinal....que vício!
Passo para o lado do rio e massacra-me o bone-shaker até Belém, as razias dos enlatados que circulam a velocidades imorais, ignorantes do quão barato é o petróleo. Nos phones cantavam os smoove "revolution will be televised". Mal sabem eles que a revolução vai silenciosa e em duas rodas.
Saio da artéria principal para uma capilar. Descansam os ouvidos, mas outro sentido ressente-se: onde é que está o Tejo?
Passo pelos companheiros matinais: os pescadores, os corredores, os trabalhadores das docas. Andam a substituir placas no chão. Têm uma carrinha mesmo no meio da passagem, deve ser difícil carregar aquele material pesado. Pura coincidência, na rádio falam de stonehedge, do mistério do transporte de pedras descomunais do local de origem das mesmas a 250Km de distância. Deviam ter carrinhas há 5000 anos atrás. Se estou nas docas devia aqui estar o Tejo! Alguém viu o Tejo hoje?
Debato-me com mais paralelepípedos, faço um slalom entre os carros da polícia marítima e desafio os furos nos milhentos cacos moídos da náite. Passo duas carrinhas de limpeza da rua que parecem sujar mais que limpar enquanto outra descarrega químicos para nos livrar das ervas daninhas, essas maldosas. Adoro curas milagrosas, tipo chapa 5 - dito com ironia - e esplanadas cheias - dito sem ironia. Mas as esplanadas hoje não estão cheias. Deve ser porque não encontro o Tejo.
Rio-me dos sinais que pedem para circular com a bicla na mão e dos carros que entram e saiem do estacionamento dos meninos do rio sem pagar para contornar a medida de acalmia de tráfego da CMLx.
Gaivotas largam objectos pesados à minha volta, parecem pedras mas não, são mexilhões. Parece a National Geographic. Se há mexilhões é porque há rio, mas hoje não consigo encontrar o Tejo.
Vou ouvindo a buzina do cais do sodré, já vejo as rampas do clube naval cheios de verdete e cruzo-me com os sem-abrigo nos seus abrigos de papelão...começo a vislumbrar o Tejo. Passo pelos taxistas parados na passadeia, na ciclovia sobre o passeio, no mar de pilarentes que fazem lembrar um ouriço-cacheiro, no estacionamento da TT onde devia estar um interface de TPs......ah finalmente vejo o Tejo.
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